17 março, 2011

Amar é música!

Ouço uma música que me faz lembrar de ti! É nestes momentos que sei o que é estar sozinha.

Leio as cartas que me escreveste todos estes anos, os nossos quase 50 anos. Sabes que foste o único homem que me apaixonou? Ainda pequenina, me pegavas tu ao colo e já eu me pendurava no teu pescoço. Não sabia o que era o amor, mas todos nos diziam que nos amávamos.

Como é que conseguiste esperar 10anos por um beijo, 10 anos para me convenceres a casar contigo, como é que eu fui a tua única mulher?

Eu bem me lembro que me levavas pela mão, como uma irmã, eu com 15anos e tu com um belo corpo de 25; bem via como te olhavam, como te apertava a mão e te abraçava dizendo-te meu.

Foste tu que criaste a imagem de AMOR, que ainda hoje tenho, que irei ter até os meus olhos não se abrirem mais.

Hoje, sou eu que te escrevo uma carta! Desde que me deixaste, desde que me mandaste embora daquela cama de hospital, desde o último olhar que perdi parte de mim. Onde estás meu amor?

Nunca quis mudar uma vírgula na nossa vida, nos nossos 50 anos desde o primeiro beijo, mas hoje a dor é avassaladora; hoje desejava que fossemos de novo uns jovens, perdidos de paixão como o fomos todos os dias. Hoje desejava que os nossos aniversários não se afastassem por 10 anos. Foram esses 10 anos, que te levaram mais cedo. Eu não quero ficar 10 anos sem ti, meu amor. Vem visitar-me, vem abraçar-me pela noite e leva-me para junto de ti.

Como eu queria o teu abraço agora; uma velha de 70 anos que nunca dormiu sem o teu beijo e abraço.

Lembras-te quando nos chateamos e até dormiste no quarto dos miúdos?! Nenhum dos dois conseguiu dormir e encontramo-nos na sala! Meio envergonhados, sentamo-nos em cantos diferentes da sala, enquanto cada um folheava o seu livro sem o ler; tantas vezes cruzamos os nossos olhares, tantas caras de desagrado, vergonha e paixão. Não lembro como, mas levantaste-te, puseste um disco, paraste à minha frente, esticaste a mão e senti-me levantar.

Não lembro mais o que disseste, mas ficamos horas e horas a dançar, enquanto senti-a as tuas lágrimas a cair pelo meu ombro!

Tenho a certeza que a Maria “nasceu” nesse dia de zangas e amor.

Hoje, sou eu que estico a minha mão para te alcançar, mas o destino enganou-nos, o destino deixou de tocar a nossa música.

O destino quis que hoje fosse eu a chorar enquanto danço de olhos fechados, pensando que te tenho nos meus braços.

Foste o único amor da minha vida, e não queria que fosse de outra maneira; quero tanto sentir-me adormecer a pensar em ti, para sonhar contigo, sonhar que durmo no teu abraço, como sempre foi, como sempre devia ser.

Hoje quero cobrar-te uma velha promessa; como foste capaz de me abandonar?!

Prometeste que seria para sempre, porque me deixaste aos 70 anos sem o amor que me habituaste a ter sempre, todos os dias, nas zangas, nas lágrimas, quando não te queria a meu lado e quando te amava mais do que devia, quando adormecíamos voltados de costas e me cobrias de pétalas ao acordar, quando te afastava e me beijavas, quando me atiravas para o sofá e te ajoelhavas para me pedir em casamento. Tantas saudades!

Quero tanto dizer que caso contigo, vezes e vezes sem conta, quero tanto ver o teu sorriso, esse teu olho verde que sempre me perturbou. Nunca tive dúvidas do teu amor, nunca seria tão feliz se a minha vida não te incluísse, se não fosses o meu amor, se não fosses tu a minha vida.

Sinto-me tão completa quanto vazia, sinto-me derrotada de saudades.

- Estou! Olá querida, como estás? Nasceu? Como?! Não era para ser hoje, hoje é o aniversário do teu pai.

Não sei como acabou o telefonema, mas o teu neto tem o teu nome, meu querido Elias.

A nossa filha decidiu dar o nome do seu pai, ao sei primeiro filho, nascido no dia do seu aniversário. Sinal ou não meu querido, nasceu um novo Elias.

Volta à música que sempre usaste para me pedir em casamento, sento-me na tua poltrona, ainda com o teu cheiro, e aos poucos vou bebendo o meu chá.

- Elias, és mesmo tu?

- Esta é a nossa música! Como podia estar noutro sítio que não fosse este? Casas comigo Lisa?

- Claro que caso meu amor. Eu sou tua para sempre, até não ter mais ar, até que me leves. Eu sou tua Elias.

(De mão estendida, e agora de pé)

- Lisa, dança comigo. Vem comigo conhecer o nosso neto.

Como é óbvio, ela casou para a vida e para a morte.

Como é óbvio, ele não a abandonou na morte.

Como é óbvio, a Lisa e o Elias viveram para além da morte.

O amor não morre quando a vida acaba. Mas muitas vezes a vida acaba quando o amor morre!

Escolhendo viver!

Escolhendo Amar!

Todos os dias!

Eliana Oliveira

(aquela que procura um Elias que a vai pedir em casamento).